Leitores do Mundo ao Meu Redor

sábado, 6 de setembro de 2008

Deus quer otimismo

Procópio acordava cedinho, abria a janela, exclamava:
– Que dia maravilhoso! O dia mais belo da minha vida!
Às vezes, realmente, a manhã estava lindíssima, porém outras vezes a natureza mostrava-se carrancuda. Procópio nem reparava. Sua exclamação podia variar de forma, conservando a essência:
– Estupendo! Sol glorioso! Delícia de vida!
Choveu o mês inteiro e Procópio saudou as trinta e uma cordas-d’água com a jovialidade de sempre. Para ele não havia mau tempo.
A família protestava contra a sua disposição fagueira e inalterável. A população erguia preces ao Senhor, rogando que parasse com o dilúvio. Um dia Procópio abriu a janela e foi levado pelas águas. Ia exclamando:
– Sublime! Agora é que sinto realmente a beleza do bom tempo integral! O azul é de Sèvres! Chove ouro líquido! Sou feliz!
Os outros, que não acreditavam nisto, submergiram, mas Procópio foi depositado na crista de um pico mais alto que o da Neblina, onde faz sol para sempre. Merecia.

(ANDRADE, Carlos Drummond de. Prosa seleta. Rio de Janeiro: Nova Aguilar, 2003.)

Nenhum comentário: