Poucas atividades humanas são mais
agradáveis que o ato de namorar, e é sobre a arte
de praticá-lo dentro dos cinemas que queremos fazer
esta crônica. Porque constitui uma arte fazê-lo bem
no interior de recintos cobertos, mormente quando
se dispõe da vantagem de ambiente escuro propício.
A tendência geral do homem é abusar das facilidades
que lhe são dadas, e nada mais errado; pois a verdade
é que namorando em público, além dos limites,
perturba ele aos seus circunstantes, podendo atrair
sobre si a curiosidade, a inveja e mesmo a ira
daqueles que vão ao cinema sozinhos e pagam pelo
direito de assistir ao filme em paz de espírito.
que se executa melhor a coberto da curiosidade
alheia. Se todos os freqüentadores dos cinemas
fossem casais de namorados, o problema não
existiria, nem esta crônica, pois a discrição de todos
com relação a todos estaria na proporção direta da
entrega de cada um ao seu namoro específico. [...]
De modo que, uma das coisas que os namorados
não deveriam fazer é se enlaçar por sobre o ombro e
juntar as cabeças. Isso atrapalha demais o campo
visual dos que estão à retaguarda. [...]
educação entre namorados no cinema. Nada perturba
mais que o cochicho constante e, embora eu saiba
que isso é pedir muito dos namorados, é necessário
que se contenham nesse ponto, porque afinal de
contas aquilo não é casa deles. Um homem pode fazer
milhões de coisas – massagem no braço da
namorada, cosquinha no seu joelho, festinha no
rostinho delazinha; enfim, a grande maioria do trabalho
de “mudanças” em automóveis não hidramáticos –
sem se fazer notar e, conseqüentemente, perturbar
aos outros a fruição do filme na tela. Porque uma
coisa é certa: entre o namoro na tela – e pode ser até
Clark Gable versus Ava Gardner – e o namoro no
cinema, este é que é o real e positivo, o perturbador,
o autêntico.